O procedimento de penhora de bens
Já falamos, aqui no blog do Lucchesi e Dolabela, sobre algumas alternativas extrajudiciais de cobrança de dívidas, em especial sobre o Protesto de títulos. Contudo, como nem sempre é possível resolver este tipo de questão fora do judiciário, precisamos abordar também os procedimentos em Juízo.
Depois de anos trabalhando com cobranças judiciais, uma situação precisa ser lembrada com frequência aos clientes: “Alcançar a sentença é apenas uma etapa do processo. Entre ter o pedido julgado procedente e efetivamente receber o valor da condenação há uma diferença muito grande.”
Isto porque quando finalmente chegamos à uma decisão reconhecendo uma dívida em nosso favor, precisamos passar para a fase execução e cumprimento de sentença. Nesta ocasião, o credor faz os cálculos atualizados do débito e o Juízo intima o devedor para fazer o pagamento voluntário da obrigação.
Contudo, na hipótese de o devedor não efetuar o pagamento no prazo assinalado, o credor deve procurar outros métodos de cobrança. Um destes métodos chama-se penhora.
Da penhora até o recebimento do crédito há um longo caminho.
Neste artigo vamos descobrir quais são as principais características deste instituto e a sua importância para pequenas empresas.
O que é a penhora?
A penhora é um instituto jurídico que significa a apreensão de um bem ou direito do devedor, por mandado judicial, para garantir uma dívida ou uma obrigação exigível.
Atenção, não podemos confundir com o penhor. Este se refere ao caso do devedor que oferta livremente um bem móvel, suscetível de venda no mercado, para o credor, devendo esta operação ser registrada no Cartório de Títulos e Documentos (artigos 1.431 e 1.432 do Código Civil).
Quais bens podem ser penhorados?
A penhora pode recair sobre tantos bens quanto bastem para o pagamento do débito. Logo, podem ser bloquados quaisquer bens ou direitos suscetíveis de avaliação monetária, liquidação e venda no mercado.
A título de exemplo, destacamos a ordem preferencial de bens a serem penhorados do art. 835 do Código de Processo Civil (CPC):
- O dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;
- Os títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em mercado;
- Os títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;
- Os veículos de via terrestre;
- Os bens imóveis;
- Os bens móveis em geral;
- Os semoventes;
- Os navios e aeronaves;
- As ações e quotas de sociedades simples e empresárias;
- O percentual do faturamento de empresa devedora;
- As pedras e metais preciosos;
- Os direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;
- Outros direitos.
Outra possibilidade de penhora é o direito de crédito do devedor. Algumas vezes o executado possui valores a receber de terceiros no mercado, podendo este direito ser bloqueado mediante pedido ao Juiz da causa.
Qual o tipo mais comum de penhora?
O tipo de penhora mais utilizado é sem dúvidas o bloqueio de contas do devedor. O Poder Judiciário possui uma ferramenta chamada Sisbajud em parceria com o Banco Central – BACEN, a qual permite ao Juiz fazer ordens de bloqueio imediato em todas as contas vinculadas a determinado CPF, bem como solicitar informações como endereços e declarações cadastradas no sistema financeiro.
Recentemente foi incorporada uma nova funcionalidade deste sistema, a chamada “teimosinha”, isto é, a renovação e continuidade de bloqueios por tempo determinado. Na prática, diariamente o sistema é retroalimentado até a satisfação do crédito. Usualmente estes bloqueios perduram por entre 5 a 15 dias.
O uso de automóveis e imóveis como garantia também são bastante comuns, notadamente quando não são encontradas quantias em contas bancárias.
Quais bens não podem ser penhorados?
Os bens chamados de impenhoráveis estão descritos no art. 833 do CPC, sendo eles:
- Os móveis, os pertences e as utilidades domésticas que guarnecem a residência do devedor, salvo os de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
- Os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;
- Os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, salvo se superarem 50 (cinquenta) salários mínimos;
- Os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do devedor;
- O seguro de vida;
- Os materiais necessários para obras em andamento;
- A pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;
- Os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;
- A quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos;
- Os recursos públicos do fundo partidário recebidos por partido político, nos termos da lei;
- Os créditos oriundos de alienação de unidades imobiliárias, sob regime de incorporação imobiliária, vinculados à execução da obra
- Os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, como impenhoráveis;
Tais bens são chamados de impenhoráveis porque não podem ser objeto de penhora. Ou seja, não podem ser utilizados para quitar débitos judiciais.
Quem pode determinar uma penhora?
Uma penhora é sempre requerida para o Juízo da causa. Portanto, será sempre oriunda de uma decisão judicial.
Qual o momento certo de pedir uma penhora?
A partir do momento em que o devedor não faz o pagamento voluntário do débito, o credor já pode pedir a penhora de bens e direitos que indicar.
Além disso, em casos excepcionais, quando há risco de dilapidação patrimonial do devedor, o credor pode pedir deferimento da garantia em caráter de urgência (art. 300 e 301 do CPC), a qualquer momento, inclusive antes de ingressar com o processo, para assegurar a satisfação do crédito.
Por que é importante para o credor?
A penhora é um instituto de garantia do pagamento da dívida. O credor que consegue penhorar um bem terá preferência no recebimento do débito quando da venda deste ativo no mercado.
Em uma situação de fila de credores, aquele que conseguir uma penhora certamente terá um lugar na frente para receber.
Tenho um bem penhorado, posso pedir a substituição?
Sim. O devedor pode, no prazo de 10 (dez) dias contado da intimação da penhora, requerer a substituição do bem bloqueado por outro, desde que comprove que lhe será menos onerosa e não trará prejuízo ao credor (art. 847 do CPC).
Meu bem foi penhorado por uma dívida que não é minha. O que posso fazer?
Toda aquele que, não sendo parte no processo, sofrer uma constrição por penhora ou ameaça de constrição por penhora sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito poderá requerer o seu desfazimento ou a sua inibição através de instrumento chamado embargos de terceiros (art. 674 do CPC).
Exemplo: A pessoa “A” compra um apartamento da pessoa “B”. No meio tempo entre a celebração do contrato de promessa de compra e venda e a formalização da escritura pública de compra e venda, o credor “X” da pessoa “B” penhora o apartamento por uma dívida de R$100.000,00. Nesse caso, como a pessoa “A” é terceira de boa-fé, ela poderá ingressar com os embargos de terceiros para desconstituir o bloqueio.
Como saber se um bem está penhorado?
O primeiro passo é conferir o registro do bem. Se for um imóvel, na matrícula atualizada emitida no Cartório de Registro de Imóveis.
Se for um automóvel, numa consulta à situação do veículo junto ao DETRAN.
Outro meio um pouco mais trabalhoso é fazer pesquisas de processos em andamento em nome da parte para verificar se existe algum pedido ou penhora em vigor. Processos em fase de cumprimento de sentença ou execuções são os mais prováveis de terem esse tipo de pedido.
É altamente aconselhável que, antes de operações de compra e venda de bens, estas informações sejam checadas para evitar contratempos futuros. A maioria dos Tribunais disponibiliza a emissão de certidões de ônus e ações em seus sites oficiais.
Quem fica responsável pelo bem penhorado?
Em caso de penhora em dinheiro via bloqueio de contas bancárias, o depositário será o Banco do devedor e, após a ordem judicial, a quantia será transferida para uma conta judicial vinculada ao processo.
Em caso de penhora de bens móveis, prioritariamente o próprio credor será nomeado como depositário.
Já no caso de imóveis, de bens de difícil remoção, ou quando anuir o credor, os bens poderão ser depositados em poder do executado.
O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence, bem como a restituí-la, com todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante.
O devedor pode dificultar a realização da penhora?
Não. Nos termos do art. 774, III, do CPC, considera-se ato atentatório à dignidade da justiça o embaraço à realização da penhora. Isto é, se ficar comprovado que o devedor tentou dificultar a penhora, pode haver a fixação de multa de até 20% do valor atualizado da cobrança.
Como é feita a avaliação do preço do bem penhorado?
A avaliação é feita pelo oficial de justiça. Se forem necessários conhecimentos especializados e o valor da execução o comportar, o juiz nomeará um perito avaliador (art. 870 do CPC).
A avaliação é dispensada quando:
- Uma das partes aceitar a estimativa feita pela outra;
- Se tratar de títulos ou de mercadorias que tenham cotação em bolsa, comprovada por certidão ou publicação no órgão oficial;
- Se tratar de títulos da dívida pública, de ações de sociedades e de títulos de crédito negociáveis em bolsa, cujo valor será o da cotação oficial do dia, comprovada por certidão ou publicação no órgão oficial;
- Se tratar de veículos automotores ou de outros bens cujo preço médio de mercado possa ser conhecido por meio de pesquisas realizadas por órgãos oficiais ou de anúncios de venda divulgados em meios de comunicação (Tabela FIPE).
E depois da penhora, o que acontece?
Após a efetivação da penhora, há três caminhos possíveis:
- Adjudicação: Se o próprio credor tiver interesse em ficar com o bem penhorado, ele pode pagar o preço de avaliação, abatendo na dívida.
- Alienação: Qualquer terceiro pode adquirir o bem penhorado pelo preço de avaliação, ou por preço menor com a anuência do devedor.
- Leilão: O bem é levado ao leiloeiro público, o qual publicará o edital e marcará a data do evento. O juiz da execução estabelecerá o preço mínimo, as condições de pagamento e as garantias que poderão ser prestadas pelo arrematante.
Conclusão
A penhora é importante recurso na hora de buscar alternativas para a satisfação do crédito da maneira mais rápida e interessante para o cliente.
O advogado deve dominar os prazos, os requisitos e as melhores oportunidades para se sair bem em discussões envolvendo penhoras. Um passo mal dado neste momento pode alongar o processo por anos com o desperdício de recursos, tempo e paciência.
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Adriano Lucchesi
Adriano Lucchesi é advogado, inscrito na OAB/MG: 176.171, e sócio do escritório Lucchesi & Dolabela Sociedade de Advogados, graduado na Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, possui pós-graduação nas áreas de Direito Desportivo e Direito do Trabalho. Tem experiência com trabalhos nas áreas de Direito Empresarial, Civil e Propriedade Intelectual.