O aliciamento na intermediação de atletas e jogadores de futebol
Popularmente conhecidos como “agentes” ou “empresários”, os Intermediários são aqueles profissionais responsáveis por representar jogadores em negociações, bem como aconselhar atletas de futebol em suas carreiras.
Recorrer a um Intermediário para conduzir as tratativas com clubes e empresas confere mais impessoalidade na negociação, permitindo que as partes possam expor seus interesses e condições sem emoções ou melindres. Sem dúvidas, uma transação ajustada com base na racionalidade dos fatos costuma ser mais satisfatória.
Além disso, o acompanhamento constante do empresário no dia-a-dia do cliente ajuda o atleta a focar com tranquilidade no seu desempenho dentro de campo.
Inegavelmente o futebol brasileiro é reconhecido mundialmente pela qualidade de seus jogadores. Para se ter uma ideia, somente nesta última janela de transferências de 2022/2023, os brasileiros movimentaram um total de €730.000.000,00 (setecentos e trinta milhões de euros), uma taxa crescente desde 2000/2001. Podemos afirmar que de cada 10 (dez) atletas negociados no mundo, 1 (um) deles é brasileiro segundo o relatório anual da FIFA.
Muito embora o mercado seja bastante sedutor, especialmente pelos glamorosos negócios retratados da imprensa, com vultuosas quantias pagas por clubes e empresas de marketing, o trabalho não é fácil, nem simples.
Para se chegar no ponto de formar um atleta de alto nível, várias etapas devem ser superadas desde a formação nas categorias de base, a estabilidade na vida pessoal e familiar, até a profissionalização em grandes clubes.
Isto torna a atividade dos empresários de futebol bastante arriscada, notadamente porque não são todos os clientes que conseguem sucesso na carreira. Quando um atleta finalmente “vinga” ou apresenta bom potencial, é natural que os Intermediários queiram se resguardar pela exclusividade na representação destes clientes.
Na grande maioria das vezes, o Intermediário começa a trabalhar com o atleta enquanto este é uma criança ou adolescente entre 9 e 16 anos, para somente colher os frutos da parceria quando o atleta celebrar bons contratos ao longo de seus 20 a 30 anos.
Logo, uma das grandes preocupações para os que trabalham com a intermediação de atletas e a gestão de carreira de jogadores de futebol é a segurança dos contratos celebrados. Infelizmente, com a concorrência forte, a pressão financeira de grandes “players”, o aliciamento de atletas tem sido uma prática frequente.
Conhecer os Regulamentos da CBF e a legislação desportiva brasileira é um instrumento útil para proteção contra essas investidas desleais de concorrentes. Pensamos nisso para elaborar este breve artigo sobre o tema.
O que é aliciamento na intermediação de atletas?
A duração do contrato de representação assinado entre um Intermediário e um jogador não pode ser superior a 3 (três) anos, segundo o Regulamento de Intermediários da Confederação Brasileira de Futebol – CBF.
É comum que estes contratos de representação e intermediação de atletas venham acompanhados de cláusulas de exclusividade de negociação para o Intermediário contratado pelo atleta.
Portanto, o aliciamento de atletas consiste na investida de terceiros para que o jogador rescinda o contrato com o Intermediário e troque de representante.
Essa situação pode ser bastante frustrante, pois no período de exclusividade de 3 anos o atleta pode se destacar e o intermediário ser roubado da oportunidade de negociar um bom contrato de trabalho e transferência.
Por isso, especialmente porque gera insegurança no mercado e corrompe a integridade das relações comerciais, essa prática é proibida pelos Regulamentos da FIFA e da CBF.
Como se proteger de um aliciamento?
Apesar de ser uma prática formalmente proibida, o aliciamento na intermediação de atletas infelizmente ainda acontece. Portanto, é necessário tomar algumas precauções para caso isso aconteça.
A primeira maneira de se resguardar é trabalhar com transparência e eficiência. O vínculo de confiança existente entre o jogador, a família e seu empresário é a primeira barreira para afastar as chances de rescisão prematura da parceria.
Em seguida, é importante que o contrato de representação preveja uma multa em valor razoável e proporcional para estimular as partes ao cumprimento de seus deveres e obrigações até o fim do prazo estabelecido.
Uma penalidade fixada em patamar irreal e alto pode ser facilmente anulada ou reduzida por bons advogados. Por isso, é extremamente aconselhável que este documento seja elaborado por um profissional especializado e consciente das peculiaridades dos contratantes.
A terceira maneira de se proteger do aliciamento é o cadastramento do Intermediário perante a CBF e o registro dos respectivos contratos de representação vigentes no sistema. Os Intermediários registrados se submetem aos regulamentos da FIFA e da CBF, o que confere acesso à Câmara Nacional de Resolução de Conflitos – CNRD e à Comissão de Ética.
Estes dois tribunais administrativos possibilitam a denúncia do aliciamento contra o atleta e/ou o intermediário, se cadastrado também, que responderá por indenizações e sanções desportivas cabíveis.
O que pode ser feito contra um aliciamento?
O Regulamento de Intermediários da CBF diz que o Intermediário não pode prestar serviço de intermediação ou firmar um contrato de representação com um jogador ou técnico de futebol que tenha contrato de representação exclusiva, registrado na CBF, com outro Intermediário.
Da mesma forma, um jogador ou técnico de futebol não pode firmar um contrato de representação com um Intermediário, ou utilizar o seu serviço de intermediação de atletas, enquanto estiver sob um contrato de representação exclusiva com outro Intermediário, salvo por autorização deste último.
Se for descumprida essa regra, o Intermediário aliciante será solidariamente devedor com o atleta das eventuais multas contratuais, bem como das perdas e danos apurados, sem prejuízo das demais sanções previstas no Regulamento da CNRD.
Por perdas e danos, entende-se alguma comissão paga ao aliciante através de uma negociação efetivada dentro do prazo de exclusividade, bem como indenizações com honorários de advogados, custas processuais e outros prejuízos comprovados.
As sanções previstas no Regulamento da CNRD são diversas e serão aplicadas conforme a gravidade de cada caso. Dentre elas há:
- Advertências;
- Multas;
- Bloqueio de repasses de premiações;
- Bloqueio de percentual do salário do atleta nos clubes;
- Proibição de atuar em atividades e competições da FIFA e CBF;
- Bloqueio de repasses de comissões;
- Proibição de registro de novos contratos de representação; e
- Suspensão ou cancelamento de registro do Intermediário.
As sanções da CNRD serão avaliadas após o denúncia de abertura do Procedimento Sancionador por descumprimento do regulamento da CBF. Esta denúncia deve ser feita no prazo de 2 anos da data do fato gerador da infração.
Em paralelo, o atleta aliciado e o Intermediário aliciador podem também ser denunciados à Comissão de Ética da CBF, sujeitando-se novamente a:
- Advertência pública;
- Multa de até R$500.000,00 (quinhentos mil reais); e
- Suspensão ou banimento de atividades relacionadas ao futebol.
A denúncia à Comissão de Ética deve ser feita no prazo de 2 anos da data da ocorrência do fato denunciado.
Por fim, existe sempre a possibilidade da interposição de uma ação civil de perdas e danos no Poder Judiciário para buscar o devido pagamento da multa contratual e das perdas e danos comprovadas pela rescisão sem justa causa da representação.
Conclusão
Com isso, esperamos ter esclarecido sobre as possibilidades de combate e proteção contra o aliciamento na intermediação de atletas no futebol.
O mercado se desenvolve a partir de boas práticas, com respeito aos contratos ajustados, lealdade e transparência – inclusive entre os concorrentes.
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Adriano Lucchesi
Adriano Lucchesi é advogado, inscrito na OAB/MG: 176.171, e sócio do escritório Lucchesi & Dolabela Sociedade de Advogados, graduado na Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, possui pós-graduação nas áreas de Direito Desportivo e Direito do Trabalho. Tem experiência com trabalhos nas áreas de Direito Empresarial, Civil e Propriedade Intelectual.
Roberto Maia Filho
Tenho uma dúvida mais específica sobre a postura do jogador Damián Suaréz do Botafogo e a postura do clube Peñarol que negociava diretamente com o jogador e influenciou o jogador a querer abandonar o clube mesmo com contrato até 2025. Poderia comentar quais são as implicações que cada um dos envolvidos pode sofrer ?