União estável: o que é, direitos e como comprovar
A união estável é reconhecida pelo Estado Brasileiro como uma forma de constituição da família e recebe, por imposição constitucional, especial proteção.
Pelas mais diversas razões, muitos casais optam pela União Estável em detrimento do casamento, mas é importante salientar que, apesar de serem diferentes, não há uma hierarquia entre os casamentos e as uniões estáveis.
Nesse sentido, havia algumas diferenças presentes na legislação que privilegiavam o Casamento (cônjuge) em detrimento da União Estável (companheiro), como por exemplo, o direito sucessório definido pelo Código Civil de 2002.
As distorções vêm sendo corrigidas pelos Tribunais que, em atenção aos princípios e diretrizes constitucionais, decidem de maneira a garantir a equidade de tratamento entre os dois institutos.
O importante, portanto, é reconhecer a existência de uma unidade familiar, expressa primordialmente pelo afeto, solidariedade e esforço comum na consecução dos objetivos.
Nesse aspecto, o elemento a ser considerado é a vontade, o desejo das partes conviventes em efetivamente constituírem uma “família” permitindo uma distinção, ainda que bastante sutil, de uma relação de namoro ou, como reconhecido na atualidade, de um “namoro qualificado”.
Não se pode perder de vista que a família é a base da sociedade e esta não é estática e passa por constantes transformações, sobretudo nos assuntos vinculados às relações sociais, dentre as quais, incluem-se as de natureza afetiva que podem, ou não, resultar em uma unidade familiar.
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Mas o que efetivamente é uma União Estável?
De acordo com a legislação brasileira, União Estável é a união entre duas pessoas de forma duradoura, contínua, com convivência pública e com o objetivo de constituição de família.
Portanto, há quatro requisitos para sua configuração:
- União Pública: é necessário que as pessoas conviventes sejam efetivamente reconhecidas como família no contexto social de sua convivência, adotando condutas públicas de mútuo cuidado e assistência. Portanto, é necessário que os conviventes se apresentem perante a sociedade como tal, tornando pública a relação afetiva e familiar.
- Contínua: deve haver uma permanência da relação no tempo. Um relacionamento marcado por sucessivas rupturas pode ser reconhecido como namoro, mas fragiliza a sua configuração em União Estável. Desentendimentos existem nos relacionamentos familiares, mas isso não implica diversos términos em intervalos curtos de tempo.
- Duradoura: sendo esse também um requisito temporal diferindo-se da continuidade. Pode existir uma união estável com duração de um ano que nesse período também foi contínua. Não se exige mais a comprovação de um lapso temporal como no passado ou mesmo a existência de filhos.
- Com o objetivo de constituir família: esse é o elemento da vontade, do desejo de efetivamente constituir família, da adoção dos comportamentos que convergem para a efetivação dos princípios que orientam as famílias: o afeto, mútua assistência, solidariedade, dentre outros. É o elemento subjetivo e mais sutil da relação.
Assim, para se comprovar a existência de uma união estável, é necessário demonstrar estes 4 requisitos, previstos no art. 1.723 do Código Civil.
Diferentemente do casamento, que, para existir, precisa de um documento formal assinado, para que a união estável exista, basta comprovar os requisitos que a caracterizam e, por isso, é considerada uma “situação de fato”.
Para tanto, podemos utilizar algumas provas, como: contas conjuntas em bancos, planos de saúde nos quais um companheiro figura como dependente do outro, declaração de dependência em Imposto de Renda, fotos, testemunhas, declaração de responsabilidade nos casos de internação ou autorização para procedimentos de saúde, aquisição de bens permanentes em conjunto, dentre outros.
É obrigatória a co-habitação?
Não! Assim como também não é exigida a co-habitação para o casamento.
Os companheiros podem morar em domicílios distintos e estarem unidos como família constituída pela União Estável.
É possível o reconhecimento da União Estável entre pessoas do mesmo sexo (relações homoafetivas)?
Apesar da Constituição e da legislação infraconstitucional definir a União Estável como a relação existente entre homem e mulher, o Supremo Tribunal Federal em decisão de 2011 equiparou a união homoafetiva com as uniões heteroafetivas.
Assim, a união entre pessoas do mesmo sexo é igualmente reconhecida como entidade familiar, merecedora de todo o amparo e proteção estatal.
Esse é um assunto que mobiliza muitas opiniões, basicamente pela resistência e preconceito, todavia é necessário primar pela preservação do ser humano e da sua dignidade.
Não se pode, sob qualquer argumento, distinguir os afetos e as relações deles decorrentes, sobretudo porque o não reconhecimento que vigiu até 2011 mantinha os conviventes homoafetivos num espaço marginal injustificável, privados de direitos reconhecidos à família, além dos danos emocionais e psíquicos que resultam do não reconhecimento social.
É possível registrar a União Estável?
Sim! E esse é um ato importantíssimo que deve ser considerado pelos conviventes quando da decisão de constituírem a União Estável.
Como já dissemos, a União Estável é uma situação de fato. Portanto, provando-se os requisitos que a caracterizam será reconhecida e protegida como tal. Mas a declaração de União Estável registrada em cartório facilita o seu reconhecimento, sem que haja a necessidade de utilizar nenhuma outra prova.
O reconhecimento da União Estável é muito importante e imprescindível em algumas situações como, por exemplo, o direito à herança, partilha de bens nos casos de dissolução, recebimento de pensão por morte, etc.
Por exemplo: no caso de morte, para que o companheiro sobrevivente possa receber a herança deverá haver o reconhecimento da União Estável após a morte (post mortem), sendo esse um desgaste desnecessário num momento tão sensível.
Nesses casos, a ausência do registro da União Estável pode levar a atrasos, desgastes emocionais e transtornos para o exercício dos direitos, exigindo longa discussão judicial ou administrativa.
Recomenda-se, portanto, que seja formalizada em cartório, lavrando-se uma Escritura de União Estável. Para emitir este documento, são necessários alguns requisitos:
- A união deve ser pública, contínua, duradoura e com o intuito de constituição de família (nesse caso haverá o ato de declaração de vontade dos conviventes);
- Estado civil de solteiro, viúvo, divorciado, separado judicialmente ou separado de fato – ou seja, uma pessoa casada não pode registrar uma união estável.
Quanto aos efeitos, é importante lembrar que Escritura Pública de União Estável não altera o estado civil, mas à instituição aplicam-se os deveres de lealdade, respeito, assistência, guarda e sustento dos filhos.
Por ser a escritura um ato notarial público, ela pode ser usada para garantir os direitos dos companheiros junto ao INSS, convênios de saúde, associações de lazer (clubes), dentre outros.
Um outro instrumento para formalização da união é a elaboração de um Contrato de União Estável, no qual deverão constar todas as cláusulas que regerão o relacionamento e pode ser feito mediante uma declaração particular ou registrada em cartório.
O reconhecimento da união estável post mortem pode ser feito pela via judicial em ação específica na qual deverão ser provados a existência dos requisitos, existência de filhos em comum, provas de convivência familiar. O companheiro sobrevivente somente poderá exercer os direitos relativos à pensão, inventário e outros após a sentença.
Como forma de garantir maior celeridade e eficiência nos processos, em benefício do cidadão, o Conselho Nacional de Justiça, através da resolução nº 35/2007 tornou possível o reconhecimento da União Estável post mortem que dentro do inventário extrajudicial do companheiro falecido. Mas somente nos casos em que houver concordância de todos os herdeiros ou não haja menores de idade ou incapazes envolvidos.
O custo da Escritura ou registro do Contrato varia para cada Estado da Federação, devendo ser consultado junto ao Cartório responsável pelo registro, via de regra o Tabelionato de Notas, nas localidades em que houver, ou no Cartório de Registro de Pessoas Naturais.
É possível averbar a Escritura de União Estável nos registros de Imóveis. Isso é importante porque para a venda de imóveis, há a necessidade da anuência do companheiro. Ou seja, o imóvel só poderá ser vendido se ambos os companheiros estiverem de acordo e, caso a venda ocorra sem esta condição, ela poderá ser anulada.
Documentação para união estável
Para a elaboração da escritura pública, o casal interessado em formalizar a união estável deverá comparecer ao Cartório portando:
- Documento de identificação com foto e CPF originais, certidão de nascimento (se solteiro) ou casamento (se casado, separado judicialmente, divorciado ou viúvo) atualizada até 90 dias,
- Informações sobre profissão e endereço (apresentar o comprovante);
- Informações sobre a data do início da relação, lembrando que a lei não exige um prazo mínimo para que seja reconhecida a União Estável;
- Definição do regime de bens aplicável à relação (regime de comunhão universal ou parcial de bens, separação de bens ou participação final nos aquestos);
- Apresentação de duas testemunhas.
Para o registro da União Estável não é obrigatória a participação de um advogado, mas recomenda-se a assistência por um advogado especialista em Direito de Família, para que sejam esclarecidas todas as dúvidas quanto aos direitos decorrentes tais como regime de bens, direitos previdenciários, sucessórios, parentalidade, dentre outros.
A União Estável acabou e agora?
Não existe divórcio na União Estável. Caso os conviventes decidam pelo término do vínculo familiar, deverão formalizar o ato pela dissolução que poderá ser feita em cartório ou pela via judicial, a depender do caso.
A dissolução em cartório é realizada por meio de escritura pública de Dissolução de União Estável, e só poderá ser realizada se for consensual (ou seja, se as partes estiverem de acordo), houver consenso quanto à partilha de bens e pensão alimentícia e não houver filhos menores de dezoito anos ou incapazes.
Caso não haja consenso ou na hipótese de existirem filhos menores ou incapazes, a dissolução deve ser realizada, obrigatoriamente, pela via judicial.
Ainda que os conviventes não tenham formalizado previamente a União Estável, é possível realizar a dissolução tanto extrajudicial (cartório) quanto pela via judicial.
Nesse caso, se realizada pela via extrajudicial, será lavrada uma Escritura Pública de Reconhecimento e Dissolução de União Estável ou, na via judicial, será proposta uma ação de reconhecimento e dissolução de união estável.
É possível converter a União Estável em casamento?
Sim! E essa é uma previsão existente na Constituição Federal que estabelece que a lei deve facilitar a conversão da União Estável em casamento.
Como já demonstrado, a legislação garante aos conviventes em União Estável toda a segurança e proteção a esta forma de constituição da família, podendo, caso desejem, converter a união em casamento que constitui um vínculo jurídico, regido pelo Código Civil, com alteração do estado civil e formalizada a partir da expedição da respectiva Certidão de Casamento.
Sendo assim, é possível realizar a conversão de duas formas. A primeira delas seria pela simples celebração do casamento, indicando a existência da união anterior em um pacto antenupcial.
A segunda forma, seria pela solicitação da conversão em cartório. Para tanto, os conviventes devem apresentar os seguintes documentos:
- Certidão atualizada de nascimento (se solteiro) ou de casamento com a averbação do divórcio ou caso seja viúvo a certidão de casamento e certidão de óbito do cônjuge falecido;
- Comprovante de residência;
- Duas testemunhas maiores de idade que conheçam os noivos e possam atestar perante o Oficial de Registro que não existem impedimentos legais para o casamento.
No cartório serão realizadas todas as conferências necessárias à averiguação de não haverem impedimentos ao casamento, realização de todo o processo de habilitação inclusive com a publicação do edital de proclamas. A diferença principal é que na conversão da União Estável em casamento não é necessária a celebração do ato em cartório.
Após cumpridas todas as formalidades legais, o oficial do cartório registrará a conversão da União Estável em casamento com a expedição da certidão de casamento.
Conclusão
A União Estável é mais uma forma de constituição familiar e, mesmo sendo menos formal do que o casamento, não é menos importante.
Essa menor formalidade garante que ela exista sem a necessidade de haver um documento que a comprove. Contudo, como vimos, é possível – e recomendável – que se faça o registro da União Estável, de preferência em cartório. O registro serve para facilitar o exercício de diretos, como os sucessórios (em caso de morte do companheiro) e os de partilha, pensão ou guarda (em caso de dissolução).
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Isis de Carvalho
Isis de Carvalho é advogada com formação complementar em Gestão de Saúde. Experiência na área de assessoria e consultoria em processos de saúde nos níveis assistenciais e gerenciais. Pós Graduanda em Direito Médico e Biodireito pela PUC-Minas. Assessoria e consultoria para prestadores de serviços de saúde nos segmentos ambulatoriais e hospitalares. Atuação em defesas administrativas e judiciais em demandas de saúde e de natureza ético-deontológica. Direito de Família e Sucessões.